Contra*Tempo

Se quisesses, os ponteiros seriam uma animação suspensa e dobrariamos o espaço-tempo por mais um beijo, ou uma dezena de palavras vincadas de saudade.

Se quisesses, desapareceriam da minha pele os vincos de saudade que não se disfarçam com roupa engomada, como num paradoxo teórico de quem volta ao passado. Mas há sempre uma hora exacta, um segundo em que se ouve o mecanismo que dá vida ao ponteiro gritar metalicamente disciplinado: o tempo acabou.

Acordo de um Déjà Vu de inquietação adolescente, agora sereno, pensando: talvez um dia saibas que te olho ingénua e carinhosamente, como olho o mar. Talvez um dia queiras, e eu me tenha cansado de contar tempo.

Uma folha branca [draft]

Quis escrever toda a nobreza e toda a dignidade numa folha branca e imaculada. Perdi horas, dias, anos. Pensei eu que seria digno de mim recomeçar todo o registo da minha vida sem uma nódoa, sem uma letra mal desenhada. Com simetria. Com perfeição. E destruí centenas de folhas imaculadas em vão. E para meu castigo, a verdade é que a perfeição está em todas as coisas imperfeitas, e o caos é a ordem natural.